quarta-feira, 4 de agosto de 2010

Educação à moda "casa-grande e senzala"

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A sociedade do Brasil escravocrata era caracterizada pela divisão entre senhores e escravos e o espaço físico também expressava essa dicotomia concretizada na casa-grande e na senzala. Transcorridos 110 anos desde a extinção oficial da escravidão pela assinatura da Lei Áurea a mentalidade e as práticas escravocratas ainda orientam a vida nacional e a divisão da sociedade, mesmo ilegal é real.

A casa-grande e a senzala repaginadas denigrem a nossa paisagem que exibe a riqueza/saber dos senhores e a miséria/ignorância do povo. A nação continua dividida entre ricos e pobres e não há no horizonte perspectivas para diminuir o fosso que se aprofunda a cada gestão. As políticas públicas que deveriam ser orientadas para diminuir as desigualdades, infelizmente parecem voltadas para sua perpetuação e aprofundamento.

Os serviços públicos destinados ao povo, direitos reais e legítimos presentes na Constituição, são encarados como favores e destorcidos pela perspectiva perversa de que “para pobre qualquer coisa serve” e somente em migalhas, o povo tem esses direitos na saúde, na justiça e na educação.

Na área da educação é evidente a orientação dessa mentalidade escravocrata, enquanto os filhos dos abastados recebem uma educação de qualidade que os prepara para o mando e a direção, os filhos dos pobres recebem uma educação sem qualidade que os condenada à subserviência e a dependência.

A negligencia para com a educação é proposital, pois tem como objetivo a perpetuação desse sistema, não permitindo aos seguimentos mais pobres da população adquirir capacitação adequada para romper os grilhões da miséria e conquistar autonomia econômica e intelectual. A escola pública, à semelhança da senzala é caracterizada pelo improviso, ao contrário da escola privada que seguindo os moldes da casa-grande é planejada. Na escola pública aprovação automática, na privada prevalece a aprovação pelo domínio do conteúdo; na pública salas superlotadas e atendimento coletivo, na privada poucos alunos e atendimento individualizado; na pública grade reduzida contemplando um conteúdo mínimo, na privada grade curricular orientada segundo as exigências dos exames para o ingresso no nível superior das melhores instituições.

Nos discursos de campanha para as próximas eleições, candidatos prometem com alarde a ampliação dos cursos técnicos profissionalizantes como avanços para a área de educação pública. É lamentável constatar que em agosto de 2010, o destino reservado para o filho do pobre não é o ensino superior, não é a capacitação para dirigir e planejar, é o caminho do eito, do trabalho para a subsistência, é preciso ocupar as mãos do pobre e deixar a sua consciência embotada, lhe permitir uma educação suficiente apenas para o trabalho físico, pois as vagas para o trabalho intelectual, que possibilitam as oportunidades de administrar, de planejar e influir nos rumos da nação, já estão reservadas para o filho do rico.
Infelizmente, na nossa sociedade os ricos interessados na manutenção do seu status-quo, endossam essa proposta educacional escandalosa e perversa, enquanto a massa de miseráveis conformada, entorpecida pelo banzo e viciada na esmola assistencialista, aceita e aplaude essa proposta na inconsciência da sua liberdade e do poder do seu voto. O triste resultado dessa prática é a manutenção da senzala e o fortalecimento da casa-grande na nossa paisagem e permanência da sociedade brasileira e do Brasil nos tempos coloniais sem ainda ter visto o raiar do século XXI.

Sem uma educação pública de qualidade a longa noite das trevas coloniais continuará dominando essas terras, a igualdade social, a justiça e a democracia continuará sendo um sonho remoto para os cativos, como evidência dessa realidade, reproduzo abaixo um texto de Paulo Henrique Amorim, publicado em seu Blog Conversa Afiada.


Paraisópolis e Morumbi: Casa Grande & Senzala
8/fevereiro/2009 22:05

“A renda das pessoas que moram no Morumbi é dez vezes maior do que a das pessoas que moram em Paraisópolis. Em Paraisópolis há quinze mil analfabetos.
No Morumbi só não vai à universidade quem não quer. Em Paraisópolis, cinco mil crianças não tem escola para estudar. A criança que for à escola aqui no Morumbi pode pagar uma mensalidade de mil, mil e duzentos reais. Oitenta por cento das pessoas que moram em Paraisópolis trabalham no Morumbi como babás, empregadas, faxineiras, seguranças, zeladores. E se você derrubar uma casa em Paraisópolis, que vale dez mil reais, e construir do lado de cá, no Morumbi, essa casa vai valer, no mínimo, um milhão de reais”.

Essa foi uma passagem que fiz para uma reportagem sobre Paraisópolis que o Domingo Espetacular exibiu.

Nesta mesma reportagem, eu disse que se trata, na verdade, da distância que existe entre “Casa Grande & Senzala”.

Paulo Henrique Amorim

Um comentário:

  1. Mas a população não terá essa dicotomia diminuída com políticas esquerdistas; pelo menos é a minha visão.

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