terça-feira, 20 de julho de 2010

A RECUPERAÇÃO RECUPERA?

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Recuperação é ato de recuperar e segundo o dicionário RECUPERAR significa:
• Recobrar;
• Reconquistar;
• Refazer;
• Adquirir novamente;
• Restaurar-se.

Considerando-se os significados acima, podemos afirmar que a recuperação aplicada aos nossos alunos concretiza, pelo menos um, desses significados? Particularmente acredito que não. É um mito da educação atual, seja na rede publica ou na privada. Para um leigo, as expressões “semana de recuperação” ou “recuperação paralela” dão a idéia que essa prática é real, entretanto não passa de um jogo de palavras.

Apesar calendário escolar, legalmente, ter 200 dias letivos, o tempo reservado para a recuperação é de uma semana por bimestre, só que este tempo é dividido entre todas as disciplinas, ou seja, o professor tem apenas o seu tempo de aula normal para entregar as notas, fazer a recuperação do conteúdo e aplicar a prova. No meu caso particular tenho apenas 100 minutos a cada bimestre, pois a disciplina história tem apenas dois tempos por semana, às vezes dependendo do dia da aplicação da prova do bimestral não há nem tempo para os alunos estudarem em casa antes da prova, essa é a situação real da recuperação prevista por lei. O real significado dessa “recuperação” é enganação, melhor propaganda enganosa, pois não há tempo e condições para ser realizada. Faça então a recuperação paralela recomendam os tecnólogos de plantão, mas parece que eles não sabem ou omitem propositadamente, a questão do tempo. É possível com apenas 100 minutos por semana, dar o conteúdo recomendado pela SEEDUC e pelo MEC, que no caso da minha disciplina já é insuficiente, e trabalhar simultaneamente a recuperação?

Acredito que criticar sem apresentar soluções é pura perda de tempo, identificar um problema e ficar só na lamentação não vai dar em nada. Quero uma educação com qualidade para os meus alunos, quero fazer o meu trabalho corretamente e confio nos meus conhecimentos e na minha formação de educadora para indicar soluções. Incomoda-me o silêncio e a omissão dos docentes diante desses fatos, o máximo que é feito é o comentário na sala dos professores e as tentativas frustradas de protesto de uma minoria durante os Conselhos de Classe, logo abafada pela pressa imposta pela burocracia e a falta de esperança de ver as reclamações atendidas.

Ser um educador é estar envolvido com o ato de educar, comprometido com a educação, ter a coragem e a teimosia de lutar pelo sucesso do aluno e também pelo seu sucesso como profissional. Há problemas, mas há soluções. Não quero passar a minha vida brincando de ser professora, sou uma professora e tenho que agir como a profissional que sou, tenho que realmente educar. Desde que coloquei os pés dentro de uma sala de aula, nunca teve um dia em que eu não buscasse entender a causa dos problemas e das dificuldades encontradas, é meu dever e minha obrigação elaborar estratégias e encontrar soluções. Na rede estadual estou desde 2007 - a opção pelo magistério foi tardia, vide o artigo abaixo - e desde então venho reavaliando cotidianamente a minha prática docente e todos os anos peço as minhas turmas para me avaliar, para vencer a timidez e o medo dos alunos, pela situação inusitada, peço a todos que escrevam a sua opinião anonimamente em letra bastão, o resultado é maravilhoso, pois não há ninguém melhor do que o aluno para avaliar o professor. Após três anos de intensa avaliação e pesquisa, posso concluir que as dificuldades têm como causa principal a estrutura do sistema. Se eu posso mudar para melhorar, se posso constantemente estar atualizando a minha prática didática, por que o sistema não pode?

A estrutura do sistema educacional vigente precisa, urgentemente, ser modificada, é necessária uma reformulação completa de toda a estrutura. O tempo destinado ao ensino precisa ser adequado à tarefa, é preciso dar aos professores mais tempo com os alunos, a grade horária tem que ser compatível com o conteúdo a ser trabalhado, não dá mais para viver no mundo do faz de conta: o rei (educação) está nu, temos que parar de fingir e admitir a realidade.

A recuperação de cada disciplina deve ter um tempo mínimo de uma semana inteira de aulas para cada bimestre. Os alunos precisam dominar os conteúdos vistos, pois caso contrário essa lacuna, no período seguinte vai se aprofundar e ao final do ensino médio será um abismo do qual o esses alunos jamais sairão.

Falam tanto no modelo de ensino da Coréia do Sul e dos países desenvolvidos, mas a implantação desses modelos fica só na teoria, o que temos é uma cópia pirata da pior qualidade, só fachada para publicidade. Por que não adotar o turno único? As mães e os pais da periferia saem às 5 horas da manhã para trabalhar e só voltam depois das 10 horas da noite, que a criança e o jovem fiquem na escola e recebam a educação que precisam e merecem. Na parte da manhã aulas, após o almoço, descanso e exercícios acompanhados pelo professor, depois lazer e reforço. O estudante coreano passa 12 horas por dia estudando, o nosso apenas 5 horas, caso não falte professor.

Outra medida importante é uma campanha de valorização do estudo e do conhecimento. Que criança ou jovem se sente inclinado ao estudo quando a aprovação é automática e os grandes ídolos e modelos de sucesso são aqueles que venceram na vida com os dons naturais? Pra que estudar se basta ter um corpaço; engravidar de uma celebridade; posar nua para a Playboy; ser dançarina de um grupo de funk, pagode ou aché; ser um jogador famoso; emplacar um funk nas paradas; ser amante eventual de alguma celebridade ou ser o dono da boca? São as Mulheres Frutas (Melancia, Melão, etc.) e os Brunos, Ronaldinhos e Tati Quebra Barraco da vida que são os ídolos da garotada. Professor ganhando R$ 620,00, médico atendendo em linha de montagem sem recursos ou cientista anônimo sem verba - tô fora! – respondem quando o assunto é futuro. Uma faxineira que trabalha na zona sul do Rio tem um salário melhor do que do educador do município e do estado, o ganho mensal de um fogueteiro do tráfico passa de R$ 2.000,00. É possível manter uma sociedade só com celebridades, faxineiras e funcionários do tráfico? Estamos vivendo um momento que apenas o dinheiro conta, independente da origem que tenha e para a criança e o jovem de hoje, dinheiro e estudo não tem relação.

Até o presente momento, nenhuma autoridade da área educacional se manifestou com relação às providências a serem tomadas com relação à crise do ensino médio no Rio de Janeiro. A constatação por parte das autoridades do prejuízo causado pela aprovação automática e da existência do analfabetismo funcional é um avanço, entretanto é urgente a elaboração de uma estratégia conjunta do estado e do município para reverter esse quadro. É urgente a criação de aulas de reforço para todos esses jovens vítimas da política educacional implementada pelo ex-prefeito César Maia, são vidas que estão em risco pela incompetência do poder público, é mais barato investir para reverter esse quadro agora do que amanhã ter que torrar recursos com balas, fuzis, blindados e batalhões de choque. Gostaria que as nossas autoridades percebessem que o custo de um aluno e de uma escola é inferior ao custo de uma penitenciária e de um presidiário. Sem mão-de-obra qualificada e segurança a possibilidade do estado atrair investidores é nenhuma. Será que só os royaltes do Pré-Sal, vão manter a economia do Rio de Janeiro, bancar a mão-de-obra importada para manter os serviços e a blindagem dos poderosos da cidade contra a violência?

Um comentário:

  1. Querida Graça!

    Concordo inteiramente contigo quando fala da incapacidade do sistema atual "recuperar" o aluno.
    A realidade é que não passa de uma nova tentativa para conquistar a "nota azul". A verdadeira recuperação deve ser feita semanalmente, na medida em que nos deparamos com as dificuldades do dia a dia. A tarefa não é fácil como alguns querem demonstrar, pois os meios que nos são oferecidos para tamanha façanha são escassos.
    A recuperação é só uma das várias facetas de uma grande farsa na qual a educação está mergulhada no nosso país.

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