quarta-feira, 13 de outubro de 2010

O EFEITO BUMERANGUE DA ALIENAÇÃO

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A polêmica em torno do analfabetismo de Tiririca é hipócrita e antidemocrática. Impedir um candidato eleito de assumir seu mandado pelo fato de ser analfabeto representa a exclusão de grande parcela da população brasileira da vida política.

Pessoalmente vejo a vitória de Tiririca, como um reflexo da falência da educação pública no país.

O feitiço virou contra o feiticeiro. O analfabetismo até as eleições de 2010 favorecia duplamente a elite letrada excluindo os iletrados da vida política como candidatos e manipulando os eleitores sem instrução.

A celeuma em relação ao analfabetismo do humorista, deveria ter sido levantada quando Florentina de Jesus, se tornou um hit nacional, entretanto para palhaço o analfabeto servia, afinal o circo, desde os tempos do império romano é uma arma para excluir a massa da vida pública. O sucesso de Tiririca, foi uma alerta ignorado sobre a saúde da educação brasileira, pois a canção caiu no gosto popular não só pela comicidade, mas, sobretudo pela identificação do público iletrado com o vocabulário da letra e com autor.

Desde então, o cenário musical vem registrando esse fenômeno. Hoje quanto mais reduzido e simples for o vocabulário de uma letra, maior será a empatia com o público e o sucesso de venda, como os funks que fazem apologia da violência ou apelam para a pornografia. Geralmente o funk de qualidade, com letras de protesto não alcança o mesmo sucesso em função do vocabulário mais elaborado e da temática. Os grandes compositores estão ficando sem público e trabalho, pois para as gravadoras o que interessa é o lucro, se as músicas vão empobrecer a cultura, reforçar o analfabetismo e a alienação pouco importa. Tati Quebra Barraco, vende mais do que Maria Bethania e Marisa Monte. O pior de tudo é isso é que a música está deixando de ser um recurso didático para se usar em sala de aula, os alunos querem e entendem justamente o que não pode ser usado, já fui intimada a substituir Vivaldi pelo "Dança do Créu" em uma aula sobre a Renascença. Esse tipo de situação é comum no nosso cotidiano.



A expressiva votação recebida por Tiririca sinaliza que a banalização do analfabetismo deixou de ser um “bom negócio” para a elite letrada, que durante séculos, monopolizou a vida política da nação. Graças à tecnologia e ao crescimento do número de analfabetos, a alienação fruto do analfabetismo está produzindo um efeito contrário ao desejado para aqueles que a fomentam.

Os analfabetos estão atingindo a fama e se tornando celebridades porque existe uma considerável massa que se identifica e se sente representada por eles, ou seja, é a apoteose da alienação produzida pelo analfabetismo. As emissoras de TV aberta, há muito já perceberam essa tendência. Sem conhecimentos para avaliar politicamente a realidade, grande parcela da população não entende as propostas defendidas pelos candidatos letrados; não se incomoda com a corrupção porque desconhece a diferença entre a coisa pública e a privada e doutrinada pela ideologia do vale tudo para obter o sucesso encara a vida pública como mais uma oportunidade para se dar bem. Os eleitores analfabetos e analfabetos funcionais, descrentes das falsas promessas não são guiados mais pela necessidade, pois sabem que a mesma não será atendida, então é a afetividade e a empatia que os guiam na escolha dos candidatos. Inconscientemente escolheram um igual para representá-los.

Portanto, analfabeto ou não, Tiririca deve ser empossado no cargo para o qual foi eleito. Se ele e seus eleitores são analfabetos, não vem ao caso, pois o que deveria estar sendo debatido é a responsabilidade de todos aqueles que tiveram oportunidade e verbas para erradicar o analfabetismo e não o fizeram.

NOTA: Incorporo abaixo os dois comentários recebidos, pois tive que recolocar o post, e não consegui enserir manualmente os comentários recebidos:



Luciano_R_Gallo disse...

Espetáculo...

Há bem pouco tempo, conversando com um amigo na Net, sobre a votação do Tiririca, ele me disse que eram votos de protesto, o que não me convenceu de forma alguma. Seu texto vem explicitar bem minha opinião que, confesso, no dia não fui capaz de colocar em palavras.

Parabéns...

(sou professor na rede pública de MG, e concordo)...

Luciano...

11 de outubro de 2010 22:57


Vanessa Vasconcelos Horner disse...

Este texto fala por mim! E' exatamente o que penso e vejo acontecer no Brasil.

Parabens!

11 de outubro de 2010 23:51

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